Estamos de volta!
Finerenona na IC com Fração Preservada: uma nova arma para a progressão silenciosa
Voltando na análise semanal de artigo, vamos começar com uma novidade que chegou no Brasil o ano passado: a Finerenona.
A finerenona é um antagonista do receptor mineralocorticoide não esteroide, atualmente recomendado pela American Diabetes Association – ADA e pelo Kidney Disease: Improving Global Outcomes – KDIGO para pacientes com doença renal do diabetes. No dia 16 de janeiro de 2023 tivemos a aprovação do registro da finerenona pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), com o nome comercial de Firialta.
Atualmente, os inibidores da enzima conversora (IECA) ou bloqueadores do receptor da angiotensina II (BRA), assim como os inibidores do SGLT2 (iSGLT2) são considerados terapia de primeira linha para pacientes com doença renal do diabetes. Uma outra estratégia para reduzir a progressão da DRD é a utilização de bloqueadores dos receptores mineralocorticoides, como a espironolactona. No entanto, esse agente tem uso limitado pela essa finalidade, em grande parte devido a preocupações de segurança em relação ao potencial desenvolvimento de hipercalemia, ginecomastia e disfunção erétil. Mais recentemente, foram desenvolvidos antagonistas do receptor mineralocorticoide usando moléculas não esteroides que aumentam mais seletivamente os benefícios e minimizam os riscos devido à alteração da afinidade do receptor e do tropismo tecidual, que é o caso da finerenona.
O FINEARTS-HF foi um estudo crucial que investigou a eficácia e segurança da finerenona em pacientes com insuficiência cardíaca e fração de ejeção levemente reduzida ou preservada.
Trata-se de um ensaio internacional, multicêntrico, de grupos paralelos, baseado em eventos, duplo-cego e randomizado.
O trial foi concebido e supervisionado por um comitê diretor em colaboração com o patrocinador, a Bayer. O protocolo foi aprovado por conselhos de revisão institucional ou comitês de ética em cada centro do ensaio. De 14 de setembro de 2020 a 10 de janeiro de 2023, 7463 pacientes de 654 locais em 37 países foram rastreados. 6016 pacientes foram randomizados para receber finerenona ou placebo. Após exclusões por erros ou violações de protocolo, 6001 pacientes foram incluídos na análise de eficácia.
Os critérios de elegibilidade incluíram idade igual ou superior a 40 anos, insuficiência cardíaca sintomática, fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE) igual ou superior a 40%, evidência de doença cardíaca estrutural e níveis elevados de peptídeos natriuréticos. A FEVE média (±DP) na linha de base foi de 53±8%. A duração média do seguimento foi de 32 meses [4, 7]. As características dos pacientes na linha de base estavam equilibradas entre os grupos. Os pacientes foram randomizados numa proporção de 1:1 para receber finerenona ou placebo correspondente, além da sua terapia habitual.
Aplicando a estratégia PICO:
P- Pacientes:
Pacientes com insuficiência cardíaca e uma fração de ejeção do ventrículo esquerdo de 40% ou superior. Esta população inclui pacientes com insuficiência cardíaca e fração de ejeção levemente reduzida ou preservada.
Critérios de inclusão específicos: idade ≥40 anos, insuficiência cardíaca sintomática, evidência de doença cardíaca estrutural e níveis elevados de peptídeos natriuréticos. 6001 pacientes foram incluídos na análise de eficácia.
I- Intervenção:
Finerenona: Administrado numa dose máxima de 20 mg ou 40 mg uma vez ao dia, adicionado à terapia habitual
C- Controle:
Placebo correspondente, adicionado à terapia habitual
O- Outcomes (desfechos):
Desfecho Primário Um composto de eventos totais de piora da insuficiência cardíaca primeira ou recorrente hospitalização não planejada ou visita urgente por insuficiência cardíaca e morte por causas cardiovasculares.
Desfechos Secundários Chave: Eventos totais de piora da insuficiência cardíaca. Alteração em relação à linha de base na pontuação total de sintomas do KCCQ (estado de saúde relatado pelo paciente). Melhora na classe funcional da NYHA. Desfecho composto renal (e.g., diminuição sustentada da TFGe, início de diálise, transplante renal). Morte por causas cardiovasculares e morte por qualquer causa.
Especificamente, os resultados foram:
Desfecho primário (eventos totais de piora da insuficiência cardíaca e morte cardiovascular):A taxa de eventos foi de 14,9 por 100 pacientes-ano no grupo finerenona versus 17,7 no grupo placebo, resultando em uma razão de taxa de 0,84 (IC 95%, 0,74 a 0,95; P = 0,007)
Eventos totais de piora da insuficiência cardíaca: A finerenona reduziu o número de eventos para 842, comparado a 1024 no grupo placebo (razão de taxa, 0,82; P = 0,006).
Morte por causas cardiovasculares: Não houve diferença estatisticamente significativa, com 8,1% no grupo finerenona e 8,7% no grupo placebo (razão de risco, 0,93; IC 95%, 0,78 a 1,11).
Qualidade de vida (KCCQ): A finerenona foi associada a uma melhora moderada na saúde relatada pelo paciente** (KCCQ total symptom score), com uma diferença de 1,6 pontos a favor da finerenona (P < 0,001).
Classe funcional da NYHA: Não houve benefício em relação à melhora da classe funcional da NYHA.
Desfecho renal composto: Não houve evidência de que a finerenona resultasse em menor risco desse desfecho renal secundário na população do estudo, que apresentava baixo risco basal de progressão da doença renal.
Segurança: A hipercalemia foi mais comum com a finerenona (3,0% com nível de potássio >6,0 mmol/L vs. 1,4% no placebo), mas raramente levou a hospitalização (0,5% vs. 0,2%) e não causou mortes. A hipocalemia foi menos comum com a finerenona. A incidência geral de eventos adversos graves foi semelhante entre os grupos.
Analisando o artigo encontramos os seguintes pontos positivos:
Desenho Robusto do Ensaio: O ensaio foi internacional, multicêntrico, randomizado, duplo-cego e controlado por placebo, o que minimiza vieses e aumenta a confiabilidade dos resultados.
Grande Tamanho da Amostra e Longo Seguimento: Com 6001 pacientes incluídos na análise e um seguimento mediano de 32 meses, o estudo teve poder estatístico adequado para detectar diferenças clinicamente significativas.
Desfecho Primário Clinicamente Relevante: O desfecho primário composto considerou tanto as hospitalizações por insuficiência cardíaca quanto a morte cardiovascular, capturando eventos significativos de morbidade e mortalidade.
Adjudicação Independente: Os eventos do desfecho primário foram adjudicados por um comitê independente, reduzindo potenciais vieses.
Análise de Eventos Totais: O uso de uma análise de "eventos totais" leva em conta eventos recorrentes clinicamente significativos, fornecendo uma medida mais abrangente da carga da doença.
Consistência em Subgrupos: O benefício da finerenona foi consistente em todos os subgrupos pré-especificados, incluindo pacientes que já recebiam inibidores de SGLT2, que são outra terapia altamente recomendada para insuficiência cardíaca. Isso sugere sua aplicabilidade mesmo em pacientes com terapia de base otimizada.
Aborda Necessidade Não Atendida: O ensaio visou especificamente uma população onde a eficácia dos antagonistas do receptor de mineralocorticoides (MRAs) não havia sido firmemente estabelecida.
E os seguintes pontos fracos:
Representação Limitada de Pacientes Negros: O ensaio incluiu poucos pacientes negros, o que pode limitar a generalização dos achados para essa demografia específica, embora a porcentagem fosse proporcional às porcentagens populacionais regionais.
Impacto da Pandemia de COVID-19: O ensaio foi conduzido durante a pandemia de COVID-19, embora resultados semelhantes tenham sido observados após a censura de dados após um primeiro episódio de COVID-19.
Análises de Subgrupo Subpoderadas: Os subgrupos pré-especificados eram subpoderados, o que significa que seus resultados individuais devem ser interpretados com cautela.
Específico para Finerenona: Os dados não permitem determinar se benefícios semelhantes seriam observados com outros antagonistas do receptor de mineralocorticoides.
Nenhum Benefício Renal Significativo: A finerenona não resultou em um risco menor para o desfecho composto renal secundário nesta população de pacientes. Isso pode ser devido ao baixo risco basal de progressão da doença renal nos pacientes incluídos, com uma baixa prevalência de albuminúria.
Nenhuma Melhora na Classe Funcional NYHA: Embora a finerenona tenha melhorado o estado de saúde relatado pelo paciente (pontuação KCCQ), ela não mostrou um benefício na melhora da classe funcional NYHA (relatada pelo médico), possivelmente refletindo a relativa insensibilidade dessa classificação.
Concluímos, então, que em pacientes com insuficiência cardíaca e fração de ejeção levemente reduzida ou preservada, a finerenona reduziu significativamente a taxa do desfecho primário composto de eventos totais de piora da insuficiência cardíaca e morte por causas cardiovasculares em comparação com o placebo. A taxa de eventos de piora da insuficiência cardíaca isoladamente também foi significativamente menor no grupo finerenona.
A finerenona também foi associada a um benefício moderado no estado de saúde relatado pelo paciente, conforme medido pela pontuação total de sintomas do KCCQ.
Em relação à segurança, embora a hipercalemia tenha sido mais comum com a finerenona, raramente levou à hospitalização (0,5% vs. 0,2% no grupo placebo) e não causou mortes. Por outro lado, a hipocalemia foi menos comum no grupo finerenona. A incidência geral de eventos adversos graves foi semelhante entre os dois grupos.
Portanto, os achados do ensaio FINEARTS-HF sugerem que a finerenona representa uma nova e importante opção terapêutica para pacientes com insuficiência cardíaca e fração de ejeção levemente reduzida ou preservada. Isso é particularmente significativo porque a eficácia de outros antagonistas esteroidais do receptor de mineralocorticoides nesta população específica de pacientes não estava bem estabelecida.
Exame da semana 🩻
Uma imagem vale mais que mil palavras...
Homem, 62 anos, com histórico de câncer de próstata metastático em cuidados paliativos, foi admitido no pronto-socorro com febre, tosse, dor torácica pleurítica e dispneia em repouso. Relatava piora progressiva nos últimos dois dias. Ao exame físico: estertores difusos à ausculta e taquipneia importante. SatO₂ de 85% em ar ambiente.
🩻 Na angio-TC de tórax:
➡️ Trombos centrais em artérias pulmonares principais bilateralmente
➡️ Múltiplos nódulos pulmonares bilaterais, compatíveis com metástases
➡️ Achados indicam quadro de TEP central associado à disseminação metastática pulmonar
💡 Dica: no paciente oncológico com dispneia e dor torácica aguda, TEP deve ser sempre considerado. A presença de trombos centrais, especialmente em contexto de neoplasia ativa e imobilização, sugere alto risco tromboembólico. A associação com nódulos pulmonares reforça o diagnóstico de metástases, exigindo abordagem clínica alinhada aos objetivos de cuidado.
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Congresso da USP, aberto a todos, com foco em correlações cirúrgico-radiológicas.
Tudo, MENOS medicina ✨
Porque a gente sabe que descansar também é ciência
1️⃣ Podcast – Respondendo em voz alta
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Descobri esse podcast recentemente (um pouco atrasada, eu sei) — mas valeu cada minuto. Se você quer alguns momentos de conversa leve, divertida e inesperadamente reflexiva, dá o play e se joga nesse falatório.
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Dona e proprietária do meu coração literário, Emily Henry entrega um livro diferente dos seus clássicos romcoms — mas com aquele aconchego inconfundível. Leitura que parece abraço, com trechos que dão vontade de grifar e nunca esquecer.
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Um bar japonês que vai muito além do sushi. Saquês, drinks autorais e pratos quentes incríveis. Fui na segurança do chopp Brahma (o ferrugem!), mas os tiraditos roubaram a cena.
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Tá todo mundo falando — e com razão. Em tese nem caberia aqui, já que fala muito sobre medicina. Mas estou obcecada demais pra não indicar. Vai por mim: vale o play.
Obrigada 🙏🙏🙏